Por décadas, pesquisadores relataram que homens que praticam exercícios intensos podem desenvolver baixos níveis de testosterona em repouso, alterações no eixo hipotálamo-hipófise-gonadal (HPG) e apresentar hipogonadismo.
Recentemente, há um interesse renovado neste tópico desde que a Comissão Médica do Comitê Olímpico Internacional (COI) cunhou o termo “Deficiência de Energia Relativa nos Esportes” (RED-S) como terminologia clínica para abordar ambas as ocorrências femininas e masculinas de problemas de saúde do sistema reprodutivo associados com exercício.
Esta ação do COI tentou ir além da terminologia específica do sexo da “Tríade da Atleta Feminina” (Tríade) e aumentar a conscientização de que alguns homens atléticos têm distúrbios fisiológicos relacionados à reprodução, como níveis reduzidos de hormônios sexuais, alterações no eixo regulador do HPG, e baixa densidade mineral óssea semelhante às mulheres da Tríade.
Existem elementos no desenvolvimento e na sintomatologia do hipogonadismo masculino relacionado ao exercício que refletem de perto o das mulheres que experimentam a Tríade/RED-S, mas também há evidências de que existem diferenças entre os sexos nessa questão.
A inconsistência e as diferenças nos achados masculinos em relação às mulheres com Tríade/RED-S não se devem apenas ao dimorfismo sexual, mas também à existência de várias formas de distúrbios reprodutivos relacionados ao exercício em homens atléticos, resultando em uma condição de hipogonadismo relativo.
Especificamente, tais condições em homens podem derivar agudamente e estar associadas com baixa disponibilidade de energia (Tríade/RED-S) ou carga de treinamento excessiva (overtraining) e aparecer de natureza transitória e resolver com intervenções clínicas apropriadas.
No entanto, existem manifestações de um hipogonadismo de base mais crônica que persiste de forma mais permanente (anos) e é denominada “Condição masculina hipogonadal de exercício”.
Que a obesidade é uma causa de hipogonadismo masculino é de conhecimento geral de profissionais de saúde, mas será que exercício físico pode reduzir a testosterona? Se sim, por que isso acontece?
Na década de 70 e 80, muitos estudos relacionaram a testosterona com o desempenho esportivo, em um deles os pesquisadores sugeriram que a testosterona, o cortisol e a proporção dos dois (relação T/C) poderiam ser usados para monitorar se um treinamento estava progredindo de forma vantajosa. Sendo então documentado posteriormente vários relatos de casos de atletas com redução de testosterona e elevação do cortisol estando relacionado ao overtraining.
Mas por que ocorre essa redução da testosterona?
Os pesquisadores descreveram duas razões principais para redução de testosterona observadas com o overtraining:
1. Fatores inibitórios (outros hormônios, por exemplo) da produção de testosterona em resposta ao estresse.
2. Ingestão calórica inadequada cursando com desregulação do eixo hipotálamo-pituitária-gonadal.
Segue o fio para entender os mecanismos
1. Fatores inibitórios da produção de testosterona em resposta ao estresse:
Níveis de cortisol muito elevados interrompem a produção de testosterona perifericamente nas gônadas (testículos). Além disso, ocorre também efeito inibitório do cortisol no LH e o FSH por meio da supressão de GnRH. Foi então observado que em alguns atletas há o aumento do cortisol de forma sustentada, podendo, portanto, contribuir para essa redução da testosterona. Adicionalmente, a prolactina que é elevada durante o exercício é outro hormônio que pode induzir reduções nos níveis de testosterona, concentrações elevadas de prolactina também podem inibir a secreção de GnRH.
2. Ingestão calórica inadequada cursando com desregulação do eixo hipotálamo-pituitária-gonadal.
A ingesta calórica deficiente, de forma crônica, causa supressão hipotalâmica da secreção do GnRH. Estudos demonstram que provavelmente envolve alterações na leptina, grelina e citocinas pró-inflamatórias que geram essa disfunção. A supressão transitória do eixo gonadal, como efeito, podem ser reversíveis com o ajuste do consumo calórico e ganho de peso; embora a taxa de testosterona nem sempre retorne ao basal.
Dessa forma, fica evidente que é possível reduzir a testosterona com exercício físico, sobretudo quando há uma desregulação do treinamento-recuperação e/ou treinamento-nutrição. Mais uma vez, é notória a importância de realizar acompanhamento profissional para realização de exercício físico, principalmente no contexto de atletas em que o volume de treinamento é maior.
Referência:
doi.org/10.3389/fendo.2020.00011
Dr Marcos Staak Jr | Médico | CRM-SC 17642
@osmanvieira